por_Antonio Carlos Miguel • de_Miami (EUA)
A expectativa para a grande noite no Kaseya Center, na qual o Brasil chegou com quatro indicações em três das categorias gerais do prêmio, não se confirmou. Mas o país não saiu de mãos vazias da 25º edição do Grammy Latino. Antes, na tarde do 14 de novembro, durante a Première realizada no Miami Beach Convention Center, onde são anunciados 49 dos 58 troféus, conseguiu três vitórias em categorias compartilhadas com 'nuestros hermanos', além daquelas nove em língua portuguesa. Ou seja, manteve a média histórica no evento, desde a sua primeira edição, realizada em 13 de setembro de 2000, também em Miami.
Mestrinho e Mariana Aydar: premiados
As três conquistas em 2024 - Melhor Álbum Instrumental (de Hamilton de Holanda, em parceria com o grupo venezuelano C4), Melhor Álbum de Jazz Latino (para Hermeto Pascoal) e Melhor Álbum de Engenharia de Gravação (para Will Bone, Leo Emocija, Rodrigo Lemos e Felipe Vassão, pelo trabalho no disco “Se o Meu Peito Fosse o Mundo”, de Jota.Pê) - estão entre os pontos positivos de uma edição na qual o Brasil chegou com sua maior comitiva e número de indicações nas categorias compartilhadas. Cerca de 400 pessoas, entre artistas, produtores, técnicos, empresários, jornalistas e executivos da indústria, estiveram em Miami, participando dos muitos eventos que movimentaram a cidade na semana do Grammy Latino.
A noite do dia 14 de novembro, com a entrega dos troféus televisionada para o mundo todo, pode ser a grande final, mas deve ser relativizada no balanço de perdas e ganhos dessa edição. Mais do que prêmios - ou indicações, estas com direito a medalhas e certificados oficiais que também devem ser comemoradas e adicionadas aos currículos de cada um -, participar in loco da semana do Grammy Latino é fundamental para a carreira de qualquer um que ambicione avançar além das fronteiras do Brasil. Durante os dias que antecederam a cerimônia, a programação foi extensa, entre atividades oficiais promovidas pela Academia Latina da Gravação (também sediada em Miami) ou por empresas nas quais a música é conteúdo fundamental. Festas, solenidades, encontros de discussão foram promovidos na cidade por, entre outros, Spotify, YouTube, Amazon, Meta, Universal Music e Billboard.
No domingo 10 de novembro, por exemplo, Lulu Santos foi o representante brasileiro homenageado na entrega dos prêmios especiais da Academia Latina. Realizada no grande teatro do Arsht Center, a cerimônia começou com o troféu Trustee, para dois instrumentistas, cantores, compositores, produtores e arranjadores, o mexicano Chucho Rincón (nascido em Juárez, em 1937) e o porto-riquenho Ángel "Cucco" Peña (nascido em Santurce, em 1948). Depois, seguindo a ordem alfabética, Lulu fechou a noite do troféu Lifetime Achievement, que foi dado a mais cinco artistas. Estes, poucos conhecidos no Brasil, com exceção do ex-Menudo, descendente de porto-riquenhos, Draco Rosa (Nova York, 1969): as cantoras cubana Albita (Havana, 1962) e espanhola Lolita Flores (Madri, 1958), o argentino Alejandro Lerner (Buenos Aires, 1957) e o grupo mexicano Los Ángeles Azules (fundado em 1976).
Participar da semana do Grammy Latino é fundamental para qualquer um que ambicione avançar além do Brasil.”
O troféu pelo conjunto da obra foi entregue ao cantor, compositor e guitarrista carioca por Gloria Groove, que impressionou a plateia com seu fluente domínio do espanhol: “Lulu é uma daquelas lendas que só aparecem de tempos em tempos. Sábio, intuitivo, intenso, destemido. Lulu mostra com a própria vida que ser autêntico não é apenas possível, mas sim necessário.”
Após a cerimônia, a festa para Lulu continuou na casa noturna ZeyZey. Organizada por Gene de Souza (radialista brasileiro radicado há três décadas em Miami, também responsável por turnês nos EUA de grandes nomes da MPB), a noite foi animada pela big band Gafieira Rio Miami.
Ainda entre as solenidades oficiais, no dia 11, os indicados em todas as categorias puderam se encontrar em festa no Frost Museum, no centro de Miami, onde receberam as medalhas, os certificados de indicação ao Grammy Latino e posaram para fotos. Gente de toda a América Latina e ainda de Portugal e Espanha circulou em meio aos aquários repletos de espécies da fauna marítima que habitam o exuberante museu de ciência. Inaugurada com sucesso no ano passado, na cidade espanhola de Sevilha, na primeira vez que uma cerimônia do Grammy Latino aconteceu fora dos Estados Unidos, a celebração dos indicados foi incluída no calendário da semana do prêmio. E, pelo que se viu em Miami, chegou para ficar.
Cupertino, d'Os Garotin
Antes, na manhã, foi realizada no Loews Hotel outra inovação recente da programação, o Leading Ladies of Entertainment, encontro exclusivo de mulheres instrumentistas, cantoras, compositoras, produtoras... Enquanto, na noite do dia 12, no Faena Forum, aconteceu o Best New Artist Showcase. Nesta que é uma das quatro categorias gerais (e principais) do Grammy Latino, o Brasil se fez presente com duas das dez indicações, a cantora e compositora Cacá Magalhães e o grupo Os Garotin. Mesmo que, dois dias depois, no Kaseya Center, o prêmio de Revelação tenha ficado com a colombiana Ela Taubert, a jovem baiana e o trio de São Gonçalo (RJ) estão entre os que voltaram ao Brasil reforçados pela indicação e pela experiência.
Por fim, na noite do dia 13 de novembro, véspera da cerimônia final, o cantor, compositor e ator colombiano Carlos Vives (nascido em Santa Marta, em 1961), recebeu o prêmio especial de Person of the Year. Ele teve suas canções recriadas por diversos artistas latino-americanos num show realizado no Miami Beach Convention Center. Nas 24 edições anteriores do Grammy Latino, o Brasil teve três homenageados como Personalidade do Ano, Gilberto Gil (2003), Caetano Veloso (2012) e Roberto Carlos (2015).
Além da programação oficial e das muitas festas que se espalharam pelo condado de Miami, na tarde do dia 11 de novembro, o Vagabond Motel - um hotel vintage de Miami que concentrou muitos brasileiros presentes nessa edição do Grammy Latino - sediou o encontro "Brasil + Latin Marketing". Nas quatro rodas de conversa, cerca de 20 profissionais da cadeia produtiva da música debateram formas de aumentar o intercâmbio. Entre outros, participaram dos debates Marcelo Castelo Branco (UBC), Luisi Valadão (Lupa Comunicação e representante do Grammy Latino no Brasil), Gene de Souza (Brazilian Nites/88.9FM WDNA), Genesio Carvalho e Mari Pacheco (POPline), Zé Ricardo (Rio2C), Kamilla Fialho (K2L), Mari Majarof (Access Midia), Clara Pablo (Maluma, Emilia), Adel Hattem (D Music Marketing) e as editoras da Billboard US Marcia Olival, Jessica Roiz, Ingrid Fajardo e Pamela Bustios.
Um dos consensos foi de que aos brasileiros sobram talento artístico, diversidade de estilos e capacidade de improvisar; mas faltam foco, disposição para trocar o sucesso por um recomeço nesses novos mercados e logística. “Se o Brasil soubesse planejar como consegue improvisar, já tínhamos conquistado o mundo com nossa música”, sintetizou Marcelo Castello Branco, diretor-executivo da UBC.
Na semana repleta de cerimônia oficiais e festas paralelas, o encontro "Brasil + Latin Marketing" contribuiu para o copo cheio. Mas nada é perfeito, e a 25º edição do Grammy Latino também teve suas falhas. Principalmente naquele que devia ser o ponto culminante. Se, para quem assistiu pela TV, a cerimônia impressionou pela grandiosidade, dentro do Kaysea Center (ginásio de esportes com capacidade para até 15 mil espectadores) a impressão foi outra. Na arquibancada, onde ficavam aqueles que compraram os convites Ouro (500 dólares) e Bronze (250 dólares), o som chegava embolado, e a visibilidade era precária, com telões pequenos, insuficientes para identificar apresentadores e artistas que se alternaram nos números musicais. Mesmo que os filiados à Academia Latina indicados ao prêmio tenham direito aos convites Diamante (mil dólares, incluindo um acompanhante, acesso à plateia e à festa do tapete vermelho), muitos acabaram passando por perrengues. Foi longa a espera para conseguir entrar no Kaseya Center, e alguns acabaram na arquibancada, servindo de figurantes.
Hamilton de Holanda
Portanto, no modo crítica construtiva, fica uma sugestão para 2025: que a Première, na qual são entregues a maioria dos troféus, seja uma festa completa, com seu tapete vermelho e um coquetel após anúncio dos ganhadores. Para a “festa oficial” e o red carpet, teriam acesso apenas aqueles também indicados às nove categorias que vão ao ar no telecast e os premiados no início da tarde. E que, no caso de realizado em ginásio, grandes telões possibilitem que todos acompanhem a cerimônia. •